Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

sábado, 11 de fevereiro de 2017

Macau - Projecto educativo de formação contínua em Patuá






























A Universidade de São José (USJ) criou um curso de formação contínua em Patuá que será ministrado pelo director da Faculdade de Humanidades, Alan Baxter, e tem início agendado para Março. Trata-se de um projecto educativo já antes pensado e que, segundo o linguista, “faz todo o sentido” que seja instituído por qualquer instituição de ensino superior local no âmbito do currículo académico de determinados cursos.

“Criei um curso direccionado e pensado para a comunidade porque é fundamental reforçar a consciência e o conhecimento da cultura e da língua do patuá. Mesmo para as pessoas que já tenham tido algum contacto com a língua”, sublinhou Alan Baxter ao Jornal Tribuna de Macau.

O curso abordará vários aspectos do crioulo português de Macau por meio de comentários e análise de textos veiculados em patuá nos séculos XIX e XX. “Vamos começar pelos versos tradicionais que hoje em dia toda a gente conhece, depois passamos para as cartas satíricas que foram enviadas aos jornais no século XIX, e há também alguns textos que têm características um pouco mais autênticas”, explicou Alan Baxter.

Outros materiais a serem estudados compreendem peças de teatro do século XX, desde teatro de Macau ao de Hong Kong, e os contos do poeta e grande defensor do patuá, José dos Santos Ferreira, também conhecido por Adé.

Para o docente e autor deste curso, os materiais em questão permitirão aos participantes conhecer as “estruturas básicas da língua, as características mais salientes em termos de vocabulário e estruturas sintáticas”, a par da “história e desenvolvimento da língua”. “Vamos contemplar alguns aspectos socioculturais presentes naqueles textos que reflectem, por exemplo, a culinária, tradições, casamentos bem como outras descrições que dizem respeito ao ambiente sócio-histórico mais amplo de Macau do século XX”, acrescentou o linguista.

Com 20 horas de formação, ao longo de oito sessões, as aulas decorrerão na USJ todas as quartas-feiras, das 18:30 às 21:00. Além disso, e uma das “vantagens” do curso prende-se com o facto de não ter quaisquer restrições em termos de participação. “O curso abrange toda a comunidade, qualquer pessoa pode inscrever-se, nomeadamente alunos da Universidade”, explicou.

Para já, as aulas serão leccionadas por Alan Baxter embora não esteja excluída a hipótese de mobilizar alguns convidados. “Tenho em mente dois, mas eventualmente poderá haver mais dependendo da disponibilidade”, disse sem avançar com mais detalhes.

Aquilo que ainda está numa fase embrionária, embora o docente admita estar disponível para abrir o curso no próximo semestre, poderá ser um primeiro passo para algo maior. Para Alan Baxter esta formação contínua em Patuá poderá ser o “começo de uma sequência”. “Vamos ver de que forma a comunidade aceita e se interessa”, apontou.

Embora a componente de avaliação não seja a principal finalidade com esta formação, o docente revelou que haverá espaço reservado durante as aulas para a realização de exercícios. “Haverá também trabalhos de casa que poderão indicar até que ponto a pessoa adquiriu conhecimentos, mas esse não é o principal objectivo”, disse Alan Baxter.

As inscrições estão abertas até ao final deste mês, e poderão ser feitas no “website” da USJ, com um custo de 1.800 patacas. As aulas serão ministradas em Português, sendo que as explicações em inglês poderão ser fornecidas de acordo com as necessidades dos participantes.

Uma iniciativa que faltava

Para o presidente da Associação dos Macaenses (ADM), Miguel de Senna Fernandes, há muito que era necessário que uma “estrutura académica suportasse a divulgação do Patuá”. Nesse sentido, sublinhou, este novo curso promovido pelo professor Alan Baxter é “uma notícia muito bem-vinda”.

“Durante todos estes anos, o Grupo Dóci Papiáçam lutou por isto só que muitas vezes a própria disponibilidade não permitiu fazer”, disse Miguel de Senna Fernandes ao Jornal Tribuna de Macau.

Embora não esteja a par do conteúdo daquele curso da USJ, nem da forma como será realizado, o presidente da ADM ressalva que os “contornos da língua” devem ser tidos em conta. “Tudo depende de como as coisas serão dadas e do que se está a falar mas há que esclarecer que Patuá é este porque sempre foi uma língua de base oral. Por isso, há que situar no tempo e perceber quais são os limites da língua”, destacou.

“No fundo, é importante para aumentar a consciência para a importância do Patuá. Há mais de 20 anos que andamos a lutar por isto, justamente para aumentar a consciencialização”, destacou.

“Apesar desta língua não ser usada diariamente é muito importante para quem se identifica como macaenses. São sempre iniciativas de louvar e aplaudo desde logo esta iniciativa do professor Alan Baxter”, vincou Miguel de Senna Fernandes.

Em Setembro do ano passado, o presidente da ADM já tinha demonstrado vontade em alterar o sistema ortográfico do Patuá de modo a que o contacto com a língua seja mais claro e, de certo modo, mais correcto. Esta ideia, assegurou, “ainda está de pé” mas continua pendente de “disponibilidade”.

No entanto, há outras ideias que poderão entretanto avançar. Segundo explicou, a geração mais nova que também integra o grupo de teatro que dirige está a pensar, já desde finais do ano passado, numa espécie de workshop sobre o crioulo.

A ideia partiu de Elisabela Larrea, investigadora e realizadora de Macau, também autora do blogue “Bela Maquista”, pensado como veículo de difusão da cultura macaense. Segundo Miguel de Senna Fernandes, a ADM terá todo o gosto em apoiar esta iniciativa que ainda está numa fase de construção e estruturação, mas que deverá ser divulgada depois dos próximos espectáculos dos Dóci Papiaçám di Macau, marcados para 19 e 20 de Maio. Catarina Almeida – Macau in “Jornal Tribuna de Macau”

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